Hoje, reflectindo neste diário póstumo sobre uma escrita não escrita, releio-me. E vejo que outrora dizia de modo encomiástico (mas tremendamente caricatural) que "a escrita era uma forma de vencer na nossa consciência reflexiva o incómodo de existir". Ah, ah, ah! Que quer isto dizer? Ainda hoje não sei, sei só que eram palavras tão profundas que não lhes vislumbro a sombra do fundo. Enfim, algo próprio de um adolescente crente nos impotentes poderes da "escrita", da "arte", da "política", ou de todas as outras coisas transformadoras de coisa nenhuma. Fosse essa coisa nenhuma "o absurdo de uma existência que nos resiste" (sic) - outra frase pró-fundo. Mais: se a literatura tem sentido é porque "fingimos inventar-lhe um sentido". Qual sentido? Inúteis filosofias. Inúteis hermenêuticas. Espuma de palavras. Pois hoje só me apetecia ir mais longe do que foi Pessoa (como se isso fosse possível), deturpando o seu estafadíssimo verso: «O escritor é um fingidor, que finge tão fingidamente, que finge verdadeiramente a dor que deveras NÃO sente». E não se tente discutir o não-sentido disto tudo. Porque a Literatura tem uma só função prática indiscutível: dar emprego a professores de Português que não gostam de literatura. Tudo o mais é uma questão de códigos de barras nos supermercados da literatura actual... O marketing editorial bem o sabe. Um bluff de quem mercadeja sabonetes com letras ou detergentes de ideias. E mais não digo. Porque também não disse nada. Viva a Literatura!
© Pedro Barbosa